O Dia Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes (18/5) é lembrado em meio à campanha de conscientização Maio Laranja. A ação busca reforçar, inclusive nos tribunais, fóruns e varas, a importância da melhoria da assistência prestada às vítimas e o rompimento do ciclo de abusos. As crianças e os adolescentes, muitas vezes, têm dificuldade em se defender, denunciar e até mesmo pedir ajuda. Com o objetivo de aperfeiçoar o atendimento aos meninos e meninas de 0 a 6 anos, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) submeteu à consulta pública a minuta do Plano de Ação da Política Judiciária Nacional para a Primeira Infância, um desdobramento do Pacto Nacional pela Primeira Infância, firmado em 2019, e da Política Judiciária Nacional para a Primeira Infância, instituída pelo CNJ por meio da Resolução n. 470/2022. Atualmente, o Pacto conta com a adesão de 354 instituições. O documento elaborado pelo CNJ foi submetido ao Plenário em dezembro do ano passado, e, no momento, está em exame na Corregedoria Nacional de Justiça. O plano trata, entre outros assuntos, da prevenção e do enfrentamento da violência, fomentando a implementação do Pacto pela escuta protegida, que busca garantir à criança vítima de abuso ou da exploração sexual condições especiais para depoimento, conforme a faixa etária e prevenção da revitimização. Quanto mais nova a criança, maior sua vulnerabilidade, por isso o plano de ação da política judiciária nacional para a primeira infância propõe estratégias para ampliar as competências dos profissionais para a escuta das crianças inclusive em linguagens não verbais e superar a dificuldade para a configuração de provas, que são necessárias para responsabilização dos agressores.

 

Esforço de implementação da legislação

 

Santo Antônio do Descoberto é um município goiano da Região do Entorno do Distrito Federal. A cidade dormitório, distante 47 quilômetros de Brasília, abriga 76 mil habitantes e é, desde fevereiro de 2023, base de implantação de um projeto piloto do CNJ que busca a estruturação da aplicação do Pacto pela Primeira Infância. Entre janeiro e abril deste ano, foram 80 atendimentos, na forma de escuta protegida, a crianças e adolescentes vítimas de abuso. A partir de ações como formação dos profissionais da educação infantil na metodologia do Eu me Protejo, aumentaram as denúncias e a oportunidade de proteger os infantes. O trabalho integrado busca garantir fluxo de atendimento por equipes técnicas capacitadas a fim de evitar ao máximo a coação e o contato com o agressor e sucessivos relatos pela criança. Na experiência de Santo Antônio do Descoberto, uma psicóloga da equipe do Centro de Referência de Assistência Social (Cras) está a cargo da função de realizar a escuta especializada. Depois do contato com a vítima, a profissional produz um relatório que subsidia o trabalho da Delegacia, do Ministério Público e do Poder Judiciário e serve para o encaminhamento de cada criança para tratamento, inclusive com participação da família. A assistência às vítimas é tarefa complexa, requer delicadeza, capacitação, sensibilidade para percepção do contexto. É comum, por exemplo, que elas sejam alvo de acusações por parte de parentes, que as responsabilizam pelo episódio de violência, pois muitas vezes há dependência econômica do agressor e temor de seu afastamento do núcleo familiar.

 

Desafios e resultados

 

Para a equipe do Cras, a dificuldade inerente à escuta protegida e a condição de projeto-piloto impõe rotina de sobrecarga. Ao mesmo tempo que reconhece a dificuldade, a coordenadora do Centro de Assistência Social de Santo Antônio do Descoberto, Suzilene Calçado, testemunha o resultado com a adoção do método. “O ganho é gigantesco porque o direcionamento prévio permite tratamento ajustado, conforme o que aconteceu.” A psicóloga conta que, graças ao método adotado, evitou situação desgastante para uma garota de 11 anos. Depois de 16 meses de tratamento, a criança superou sequências de noites sem dormir e abstinência alimentar. “O juiz decidiu recuperar laudos antigos, feitos com base na escuta protegida e evitou que a vítima revivesse todo um trauma”, relata. Os casos de abuso e exploração sexual de crianças e adolescentes estão a cargo, no município goiano, da 1.ª Vara Cível, de Família, Sucessões e da Infância e da Juventude. “A escuta protegida é uma prática fundamental dentro do Pacto Nacional Pela Primeira Infância, objetiva garantir que vozes e direitos das crianças sejam respeitados e considerados em todas as decisões e ações que as afetam”, afirma a juíza responsável pela unidade judiciária, Ailime Martins. “A interação entre Poder Judiciário, beneficiários e órgãos de proteção preserva o melhor interesse dos infantes e objetiva uma prestação jurisdicional efetiva.”

 

Diretrizes

 

A magistrada tem opinião fundamentada no cotidiano do projeto-piloto do CNJ. “Na esfera pré-processual, há o investimento no futuro das crianças, a redução das desigualdades sociais, o fortalecimento de vínculos familiares, a prevenção de problemas sociais, a promoção do desenvolvimento sustentável”, destaca. “Já na esfera judicial, os benefícios são a proteção máxima das crianças, usando os mecanismos disponíveis: escuta protegida, estudo social efetivado com profissionais capacitados, realização de audiência concentrada.”

 

Fonte: CNJ